Pesquisa realizada pela Play BPM revela hábitos de consumo do público em eventos e apresenta reflexões da cena eletrônica atual
A Play BPM realizou uma Pesquisa sobre Hábitos de Consumo em Eventos com 226 pessoas e o que descobrimos vai te surpreender.
Abordando os assuntos mais discutidos e desvendando novas pautas, a pesquisa, realizada no 1º semestre de 2024, revela os gostos, opiniões e sugestões do público para a construção de uma cena musical mais desenvolvida.
Confira abaixo os resultados obtidos e nossa reflexão acerca dos dados:
Perfil do público:
A maioria dos participantes (37,14%) são considerados ‘Millenials’, isto é, têm idade entre 30 a 40 anos. Além disso, São Paulo é o estado que concentrou grande parte do público, com 61,32%. Não à toa, é a região que mais movimenta a cena eletrônica no Brasil, recebendo inúmeros festivais e eventos mensalmente.
Ingressão na cena:
A pesquisa avaliou a época em que os participantes tiveram seu primeiro contato com o mercado de eventos. Um fenômeno interessante foi observado aqui: parte considerável dos pesquisados (21,25%) ingressaram na cena eletrônica após a pandemia.
Esse dado reitera uma mudança de público que tem sido observada nos últimos 5 anos. Com o retorno efervescente dos shows após a quarentena global, os jovens estão explorando outras sonoridades e vivendo experiências novas – fator que refletiu na adesão de mais pessoas à música eletrônica.
É possível avaliar também que a chamada “era de ouro” da Dance Music (2011 – 2015) expandiu definitivamente a comunidade de fãs do gênero, com 26,25% dos participantes ingressando na cena durante a época.
Frequência nos eventos:
O público se mostrou assíduo na participação de eventos da cena (festivais, clubs, etc.), com 22% indo pra mais de 10 rolês num período de apenas 1 ano. As festas mais frequentadas aconteceram em São Paulo, sendo as 5 primeiras: Tomorrowland (26,79%), Laroc (24,11%), Time Warp (18,75%), Só Track Boa (13,39%) e Afterlife (11,61%).
Além disso, mais de 60% afirmou que costuma viajar para ir a eventos da cena eletrônica, tanto pro estado de São Paulo como em outros polos do mercado, a exemplo de Minas Gerais e Santa Catarina.
Reflexo do crescimento exponencial de público, a oferta de eventos no mercado expandiu fortemente. Com isso, a enorme variedade de shows de música eletrônica nos últimos anos permitiu que as pessoas vivenciassem ainda mais experiências e participassem ativamente da cena eletrônica.
Para alguns, uma ótima notícia. Para outros, a dificuldade de fazer a escolha certeira do rolê.
Motivos que mais influenciam a ir pra um evento:
Dentre os aspectos que se mostraram mais essenciais para os participantes comprarem ingresso, o line-up foi disparadamente o fator principal (96%).
Além dele, o local (64%), valor do ingresso (57%), tema/conceito do evento (43%) e companhia (25%) também se destacaram no ranking.
Podemos dizer que dependendo de quem for tocar, a gente faz um sacrifício no bolso pra ir pro evento, né?
Fontes de informação:
Neste tópico avaliamos por onde a galera se mantém atualizada da cena. Canais de música eletrônica, como a própria Play BPM, figuraram no topo da pesquisa (94%). Em sequência, as redes sociais dos artistas (65%) e de eventos e produtoras (64%) também se destacaram, demonstrando a força da comunicação e divulgação online para o sustento do mercado atual.
Um detalhe que chamou atenção foi a utilização dos grupos de Whatsapp (50%) para a obtenção de informações da cena. O contato mais próximo com o público através de aplicativos de mensagem pode ser um trunfo secreto na promoção de eventos e de novos lançamentos.
Gasto nos eventos:
A música eletrônica segue sendo um dos gêneros musicais mais caros para se curtir ao vivo. Sem contar o valor dos ingressos (que nos últimos anos tem crescido exponencialmente), o custo para se manter dentro dos eventos se mostrou alto no bolso de quem participa.
Segundo a pesquisa, considerando bebida, alimentação e locomoção até o local da festa, a maioria (30,5%), gasta em torno de R$ 200 a R$ 300 – quase 20% do salário mínimo.
Inevitavelmente, o mercado de música eletrônica apresenta-se como uma cena excludente, acessível essencialmente para uma parcela mais nichada da população. É evidente que coletivos e iniciativas mais democráticas existiram e hão de existir, mas a ida a grandes festivais como o Tomorrowland, por exemplo, é realidade para poucos em nosso país.
Team after ou team casa?:
Com a mudança de gerações já demonstrada em nosso relatório, o hábito de curtição também se transformou nos últimos tempos. A maior parcela dos pesquisados (70,40%) relatou que prefere ir pra casa após um evento, com somente 29,60% aderindo aos afters.
Esses dados retratam como as prioridades do público estão mudando. Para alguns, a preocupação com a saúde e bem-estar do corpo estão se sobressaindo sobre a vontade de continuar a noitada, para outros, a responsabilidade com a família tem falado mais alto.
Muitos são os motivos que podem explicar essa mudança de perspectiva, porém, independente da época, vai ter rolê pra todos os gostos, do inimigo do fim ao mais simplista.
Substâncias mais consumidas:
Fugindo de tabus e compreendendo a importância da redução de danos para o desenvolvimento de uma indústria musical mais responsável, procuramos saber quais são as substâncias mais consumidas pelo público.
O álcool liderou a pesquisa, com quase 70% de adeptos, seguido de Ecstasy/Bala (50,4%), MD (43,8%), Maconha (20,8%) e LSD/Cogumelo (16,8%).
Além disso, 83,66% afirmou que consegue aproveitar um rolê sem usar qualquer tipo de substância, com apenas 2,76% associando festas eletrônicas a drogas.
Situações que mais incomodam:
Neste tópico, buscamos ouvir as reclamações do público e compreender o que vem incomodando os fãs que frequentam shows de música eletrônica.
Considerando a frequência que os termos foram abordados, podemos destacar os seguintes pontos:
- Superlotação (24,05%): como citado anteriormente, a chegada em peso de novas pessoas à cena eletrônica tem sido o maior problema pra quem frequenta eventos. Aperto e pouco espaço pra dançar estão entre as situações mais incômodas.
- Leques (15,19%): Em segundo lugar, uma discussão que movimentou bastante a cena nos últimos anos: o uso de leques. Com o crescimento de seu uso nas festas eletrônicas, muitos reclamaram do barulho feito pelo objeto, motivo pelo qual já o fez ser banido de alguns eventos pelo país.
- Brigas (15,19%) e Roubo/Insegurança (13,92%): a música eletrônica sempre foi movida pelo espírito de união e respeito – o PLUR, mas ultimamente isso tem mudado. O relato de brigas nas festas e o sentimento de insegurança por causa da violência chegou também no nosso mercado. Assim como toda mazela social, são procurados motivos, culpados e diversas soluções para o problema, mas dificilmente chegamos num denominador comum. Com um público ainda maior, a cena recebeu pessoas de diversos tipos – e infelizmente algumas de má índole.
- Celulares (3,8%): surpreendentemente, o uso de celular nas pistas de dança representou apenas 3,8% das reclamações do público. O tema que ficou em alta nas redes sociais neste ano por causa de eventos como a Afterlife, na realidade, parece que existem preocupações maiores pra quem frequenta shows de música eletrônica no Brasil.
Período preferido para ir a festas:
O mercado global de eventos está aderindo uma grande tendência dos últimos anos: o formato diurno.
Diferentemente de anos passados, quase 40% dos participantes da pesquisa demonstraram interesse em festas durante o dia.
Essa alta porcentagem é reflexo do tópico #7, no qual as pessoas tem preferido começar a curtição cada vez mais cedo para ter tempo de descansar o suficiente em casa pela noite.
Além de nosso relatório, diversos outros estudos comprovaram este novo hábito de consumo do público da indústria musical – e provavelmente vai se consolidar de vez futuramente.
Formato favorito:
Os rolês Open Air (a céu aberto) são outra grande potência do mercado moderno. A cultura clubber ainda segue viva aos fãs do Indoor, mas 78,8% das pessoas optaram por ambientes abertos.
Esse formato, que já é estabelecido em grandes festivais do mainstream (Tomorrowland, Ultra e EDC), agora tem chegado na cena underground, como no Time Warp, por exemplo.
Gêneros mais escutados:
De tempos em tempos, novas vertentes vem e vão nos holofotes globais da cena eletrônica. Apesar do melodic techno e afro house estarem no topo das vendas, o público da Play BPM teve como o progressive house (48,2%) sua vertente favorita.
O Hard Techno, que teve um hype absurdo nos últimos anos, figurou apenas na 8ª posição (21,7%) entre os gêneros.
Confira abaixo o gráfico completo:
O que falta evoluir para termos uma experiência melhor?
Através das respostas subjetivas dos participantes da pesquisa, a Play BPM percebeu que o caminho para melhorar a cena nacional perpassa por muitas camadas.
Dentro do espectro dos eventos, os line-ups precisam se reinventar, trazendo novos artistas e apostando em talentos nacionais. Os ‘ticket-sellers’ tornaram-se a base da maioria das festas e está cada vez mais difícil de nos surpreendermos com sets inéditos e com identidade própria.
A inflação dos preços, tanto na perspectiva de quem produz como para o público consumidor, é uma realidade crescente e precisa ser interpretada como uma questão mercadológica global. Com o hype da música eletrônica e o alto custo de equipamentos e voos, viver experiências da cena tem sido algo mais seletivo.
Com isso, o nível de entrega do evento tem que estar alinhado com o investimento proposto. As marcas precisam se dedicar à oferecer mais conforto, segurança, organização, inovação e claro, curadoria musical de qualidade.
O problema que temos encontrado nas pistas de dança, com as pessoas cada vez menos dançando e valorizando a música e o artista, pode ser por conta do novo público que adentrou à cena pós-pandemia e não entende ou consome a música eletrônica da mesma forma que estamos acostumados. Além disso, a cena eletrônica precisa estar preparada para a chegada desses novos públicos. Os eventos necessitam investir em maior policiamento (dentro e fora das festas) e se esforçar para educar seu público, ressaltando valores como paz, amor, união e respeito – os princípios primordiais da música eletrônica.
A carência de espaços para realização de festas é outro problema estrutural que necessita ser observado. Diversas capitais pelo Brasil propõem eventos nos mesmos locais há anos, mas, para além de uma decisão dos produtores, essa situação se interliga às questões políticas, seja pela dificuldade de conseguir autorização com as autoridades ou pela falta de opções ofertadas.
Além de tudo isso, precisamos olhar para nós mesmos e refletir sobre a redução de danos. A presença de drogas nos rolês não é segredo pra ninguém, mas é necessário entendermos que nem sempre precisamos delas para se divertir. Longe do moralismo, é essencial que tenhamos consciência dos limites de nosso próprio corpo e da nossa mente. A música é uma arte com muitas formas de ser apreciada, encontre a sua melhor forma sem que ela te prejudique.
Confira os resultados da pesquisa na íntegra clicando aqui.
Imagem de capa: Reprodução.
Sobre o autor
Caio Pamponét
Graduando em jornalismo pela UFBA e Redator da Play BPM. Um apaixonado por música desde a infância que cultiva o sonho de viajar pelo mundo fazendo o que ama e conhecendo novas culturas. Com um desejo inerente de fomentar a cena eletrônica de sua terra - Salvador, BA, Caio Pamponét respira os mais diversos BPM's e faz da música o seu combustível diário.