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ENTREVISTADO #7: Versátil e multitarefa – descubra de onde vem o sucesso de Eli Iwasa

Dia após dia acompanhamos artistas na cena eletrônica feminina brasileira brilharem lá fora e aqui dentro, além de produtores musicais lançando em labels de figuras estelares mundiais de todos os gêneros. Porém, quem está em ascensão, com o nome cada vez mais forte por onde passa, é uma dessas mulheres multitarefas, que consegue circular muito bem em papéis dos mais diversos possíveis. Da cabine de DJ ao escritório, do estúdio de gravação à produção no Caos, mulher que ajuda a fomentar a cena techno no país desde o final da década de 90: essa é Eli Iwasa. Em meio a comemoração de seus 20 anos de carreira, batemos um papo sobre a cena atual, sua carreira, comemorações e outras curiosidades em uma entrevista exclusiva que você confere abaixo:

Play BPM: Hellou Eli! Tudo certo por aí? Obrigada por ter aceito nosso convite para participar do quadro ENTREVISTADO! É uma honra ter uma mulher como você fazendo parte do nosso time! Vamos começar dos primórdios: qual seu nome completo, idade, cidade natal e há quantos anos você é DJ e Produtora? Eli Iwasa: O prazer é meu! Me chamo Eliana Sumiko Iwasa, tenho 43 anos, nasci em São Paulo, mas atualmente resido em Campinas, completo 20 anos de noites em 2019 e 18 como DJ.

Play BPM: Desde muito cedo você já despontava como protagonista de um gênero musical que evoluiu, ganhou as massas e hoje é uma indústria que movimenta bilhões de dólares por aí. A partir de qual momento você sentiu aquela vontade de ser DJ? Você tem alguma data ou momento específico que realmente considera que tenha começado sua carreira? Eli Iwasa: A minha primeira gig profissional foi em 2001, no club Absinto, em São Paulo. Era uma noite do Pet Duo, formado pela Ana e o David, que hoje residem em Berlim. Eu tocava há um tempo, mas somente em casa ou afters – já tinha um trabalho sólido organizando as noites de sexta feira no Lov.e Club, e não queria misturar as coisas. A Ana me convidou para tocar na noite deles depois de me ver tocar em sua casa, e desde esse dia, nunca mais parei.

Play BPM: Quem são os artistas que mais despertaram em você o sonho em seguir na carreira da música? Existe algum nome que te motiva até hoje? Eli Iwasa: Sempre cito o DJ Mau Mau – desde a época do Hell’s Club como frequentadora, até 7 anos de trabalho juntos no Lov.e Club, o Mau dava uma aula sobre o que é ser DJ a cada set – generoso, apaixonado, conectado com a pista. Ele foi minha maior inspiração e espero conseguir transmitir isso em minhas apresentações. Carrego muito do que aprendi com ele comigo até hoje.

Play BPM: Quem era Eli Iwasa aos 17 anos? Eli Iwasa: Era uma menina apaixonada por pós-punk, goth e industrial, colecionadora de discos obscuros e Sandman, e frequentadora assídua de shows.

Play BPM: Já que estamos falando em primórdios, você sempre teve a aceitação e a credibilidade de seus pais ou foi algo que você teve que ir conquistando aos poucos? Atualmente, como é para eles saber que você está mais do que realizada em sua profissão? Eli Iwasa: Meus pais achavam que fazer festa era uma coisa temporária – tinha acabado de me formar na ESPM e feito extensão universitária na UCLA, então eles achavam que, eventualmente, atuaria na área. Nunca mais olhei para trás. Meu pai queria que eu fizesse economia (que cursei por 1 mês rs), e assumisse a fábrica de sorvetes da família, mas depois de um tempo, ele virou para mim e falou: “você nunca vai fazer sorvete, né?”. Levei meu pai para algumas gigs para ele entender o que é meu trabalho de DJ, fui tocar na cidade que ele mora, e era um evento na praça central, enorme, promovida pela prefeitura. Hoje ele morre de orgulho, pede CD ou ingresso para dar para os amigos dele (risos), e mais importante de tudo, sabe como sou feliz com minha carreira.

Play BPM: Vimos em seu Instagram uma foto em que você demonstrava ter uma grande ligação com o seu irmão. Como era a relação de vocês dois quando crianças e agora já adultos? Qual é a maior lembrança de vocês dois juntos? Eli Iwasa: Eu e meu irmão somos muito amigos – e tenho sorte de ter tanta afinidade com ele, que é só um ano mais novo que eu. Lembro de quando tinha 4 ou 5 anos, e me irmão chorou tanto na escolinha quando ficamos em salas separadas no primeiro dia de aula, que tiveram que deixá-lo na minha turma durante todo ano. Uma das lembranças mais especiais que tenho é de termos assistido o show do David Bowie juntos. Ele também ama música, e durante a nossa adolescência dividíamos discos e fomos a muitos shows.

Play BPM: Em menos de 2 anos vocês já transformaram o Caos em um dos destinos mais desejados do Techno e house em São Paulo. O que tem por trás do trabalho de curadoria que o público em geral não vê? Eli Iwasa: O que é feito em termos de curadoria no Caos equilibra grandes nomes com jovens talentos – e além dos grandes ticket sellers como Dixon, Nina Kraviz ou Laurent Garnier, gosto de apostar em artistas que tem um trabalho interessante, mas que nem sempre são tão conhecidos do público. O desafio é oferecer uma programação interessante, que resuma nossa visão artística, ao mesmo tempo que encaramos desafios como o dólar alto, a carga tributária pesadíssima e o momento econômico e político tão complicado.

Play BPM: Como você enxerga a cena underground no Brasil nos dias de hoje? Eli Iwasa: A cena é cíclica: uma hora é dos grandes festivais, outra hora das raves, uma hora dos clubs, mas o underground nunca vai deixar de existir. Ele é a fonte de informação e renovação – novos artistas, sonoridades, formatos. É onde o que é mais interessante acontece – olha a cena de São Paulo, de Belo Horizonte; são as festas underground que são a nova cara e identidade do que é feito de legal no Brasil, com visibilidade para o mundo todo, com núcleos como Mamba Negra, 1010 e Carlos Capslock.

Play BPM: DJ, produtora, cantora, empresária e modelo! Existe algum segredo para conseguir administrar e conciliar todas essas funções ao mesmo tempo e conseguir ser impecável em cada uma delas? Eli Iwasa: Essa semana estava no meio do olho do furação, e sendo bem honesta, bateu um certo pânico: e quando tudo que eu desejei para mim realmente aconteceu, será que estou pronta? Um dos desafios é organizar meu tempo para conseguir dar conta de tudo – para mim, de nada adianta trabalhar e ser sucedida, se não encontrar tempo para desfrutar com meus amigos e minha família. Eu sempre fui levando as coisas sem muito planejamento, mas hoje, sem organizar meu dia, hora por hora, é impossível entregar tudo da maneira que gostaria.

Play BPM: É inevitável não associar o seu nome com o mundo da moda quando nos deparamos com seu bom gosto quando se trata de looks. Na sua opinião, qual foi sua maior dificuldade e aprendizado depois de ser responsável pelo conceito sonoro da coleção verão 2020 do grande Diego Fávaro, e ter em suas mãos um desfile com sua trilha sonora tocando do início ao fim? Eli Iwasa: Quando comecei a pensar na trilha, me encontrei com o Diego para entender principalmente a atmosfera e o ritmo que ele gostaria para o desfile. Isso foi fundamental para definir a linha de som que seguiria – e de cara, pensei no Autechre: cinemático, com uma dose de força e drama.

Bate Bola Jogo Rápido: Play BPM: 1 destino dos sonhos: Eli Iwasa: Islândia Play BPM: 1 arrependimento de vida: Eli Iwasa: Nenhum – das vezes que errei, ganhei uma lição. Play BPM: 1 momento inesquecível em sua carreira: Eli Iwasa: Tocar com o Peter Hook, e as apresentações no DGTL e Warung Day Festival. Play BPM: 1 momento inesquecível em sua vida pessoal: Eli Iwasa: Levar meu pai ao Rock In Rio. Play BPM: 1 música que te inspira: Eli Iwasa: Tenho milhares! Mas eu amo a “Because The Night” cantada pela Patti Smith. Play BPM: 1 DJ: Eli Iwasa: Laurent Garnier Play BPM: 1 collab: Eli Iwasa: Com o Marco AS e nosso Bleeping Sauce Play BPM: 1 pessoa: Eli Iwasa: Meu irmão… Que é a melhor pessoa que conheço Play BPM: 1 bebida: Eli Iwasa: VInho e champagne. Play BPM: 1 club/festa inesquecível: Eli Iwasa: Club é o Caos, né? (risos) Berghain também – se bem que eu gosto mais do Panorama Bar para ser honesta.

Play BPM: Vinte anos de carreira! Você se recorda quais eram suas maiores preocupações ou dificuldades no começo de sua jornada? Olhar para trás duas décadas depois de ter passado por esses aprendizados, sendo muitos deles bons ou até mesmo ruins, e ver que você se tornou o que é hoje te traz a sensação de que você está no caminho certo? Eli Iwasa: Quando comecei minha preocupação era de tocar profissionalmente apenas quando estivesse pronta e soubesse com total precisão o que estava fazendo. Não queria que questionassem minha habilidade como DJ. Como mulher, eu sabia que muita gente “queria ver se eu tocava direito”, ou soltavam que “eu tocava como homem”, como se fosse um elogio. E apesar de tudo, as DJs mulheres passam por isso… A gente tem que batalhar muito, se provar muitas vezes, e calar muitas bocas com o valor de nosso trabalho.

PLAY BPM: Já que estamos falando sobre o grande marco de seus 20 anos de carreira, como está sendo para você embarcar em uma maratona em 10 grandes festivais desde Time Warp ao Rock in Rio levando a música eletrônica aos palcos dos mais importantes eventos do Brasil e do mundo? Ainda existe aquele friozinho na barriga antes de cada apresentação? Eli Iwasa: Sempre! No dia em que não sentir isto mais, sei que será hora de parar.

PLAY BPM: Seu estilo, pesquisa musical, carisma e mixagens impecáveis também lhe renderam mais um convite para tocar em Outubro no ADE, maior conferência de música eletrônica do mundo, em Amsterdam, na festa label do europeu Life and Death, casa de importantes artistas do meio eletrônico. Pouco depois, seu nome já está confirmado na segunda edição brasileira do histórico Time Warp, simplesmente um dos maiores e mais respeitados festivais de techno e house do mundo. Colocando em ascensão esses dois grandes eventos, como está sendo sua preparação para marcos como esses em sua carreira? Você está preparando alguma coisa diferente do que você costuma fazer nas pistas? Eli Iwasa: Honestamente, nada muito diferente. Claro que o trabalho de pesquisa é mais profundo e intenso, e a vontade de entregar algo especial é ainda maior, mas tenho que fazer o que sei e o que sou, mostrar minha bagagem e a artista que me tornei ao longo destes anos. Gigs como essas me deixam mais ansiosa, então a preparação é física e mental – estar descansada, focada, confiante de que vou fazer o meu melhor.

PLAY BPM: Todos esses eventos são intercalados a uma agenda cheia, com duas ou três gigs todos os finais de semana, em eventos de norte a sul do país juntamente a administração dos clubs. Você tem algum dia específico reservado somente para você? Nesses dias você prefere qual programação? Eli Iwasa: Durante a semana minha rotina é BEM tranquila. Acordo super cedo, faço meu café, vou ao cinema, passeio com a Paçoca, e é quando abro uma janela para estar com meus amigos e minha família. É difícil tirar um dia todo só para mim, mas minhas manhãs são dedicadas para cuidar de assuntos pessoais – de supermercado a banco, de pilates à manutenção da minha casa.

PLAY BPM: Atualmente como é para você olhar ao seu redor e ver tantas outras mulheres na cena eletrônica tendo o seu nome como fonte de inspiração para as próprias carreiras? Eli Iwasa: Quando comecei, nunca imaginei me tornar inspiração para ninguém, e até hoje, é meio maluco quando alguém me fala isso. Mas eu espero mesmo que meu trabalho inspire outras mulheres a começar a tocar, a fazer seus eventos, para ocuparmos cada vez mais esse espaço dentro da indústria – ela ainda é predominantemente masculina, mesmo que hoje, muitas mulheres tenham consolidado seu protagonismo no mercado.

PLAY BPM: Para realmente finalizarmos esse bate papo mais do que incrível, a última pergunta: Você, com toda sua experiência desde a parte administrativista até a prática de uma carreira eletrônica teria algum conselho para quem sonha em fazer parte desse mundo? Qual é a mensagem que você gostaria de deixar a todos que te acompanham e que admiram não só sua carreira mas a grande mulher que você é? Eli Iwasa: Nunca se esqueça dos motivos pelos quais se apaixonou por esse universo.