Entrevistas

Após depressão, Heisen, nome do techno melódico brasileiro, dá a volta por cima com novos lançamentos

Por Lau Ferreira

Não é segredo pra ninguém que a terrível pandemia do novo coronavírus, além de ceifar muitas vidas e devastar famílias em todo o planeta, atingiu profundamente a economia mundial, e o setor do entretenimento foi um dos mais prejudicados. No caso de projetos que estavam recém começando a dar seus primeiros passos consistentes, foi um golpe duríssimo. Mas se por um lado esses artistas perderam sua principal fonte de renda e ficaram sem poder se apresentar, por outro, tendo um bom planejamento e boa orientação, vem sendo possível achar caminhos.

Com o catarinense de Itajaí Matheus Guilherme Pereira de Oliveira, tem sido mais ou menos assim. Um background de quase uma vida inteira de 24 anos imersa em música, com uma diversidade enorme de gêneros, metade dela já se arriscando na produção musical, somada a alguns pontos-chave para definirem sua identidade — a famosa coletânea “Substance”, do New Order; o clipe de “Gettin’ Over You”, de David Guetta, que o levou a produzir EDM; e, mais recentemente, Gui Boratto, Elekfantz e Stephan Bodzin, que o trouxeram de vez ao techno melódico.

De 2019 para cá, Matheus definiu os rumos que queria tomar, e com a companhia essencial de sua noiva, Byanca (que esteve ao seu lado em todos os momentos e trabalha no marketing de seu projeto), se jogou no competitivo mercado da música eletrônica como Heisen . Depois de anos imerso no estúdio, teve a oportunidade rara de lançar suas primeiras tracks pela DJ Sound Music, que é distribuída nacionalmente pela Universal Music Brasil, graças a ajuda de Gonçalo Vinha, CEO do DJ Sound Media Group, a quem o jovem conheceu quando estudava o mercado. Assim, surgiram “Try Again”, em 2019, e “Bad Suggestion”, em 2020 — dois sons techno bastante melódicos e acessíveis.

Agora, para 2021, os planos são ainda maiores: Heisen pretende trazer nada menos que 12 músicas novas ao longo deste ano, e com toques de alguns mentores de respeito, como DJ Meme e Renato Ratier, mas sobretudo trabalhando com muito coração, verdade e humanidade — o que fica claro a partir do momento em que se conversa com ele —, tem grande potencial para se tornar um nome cada vez mais conhecido.

Quer entender melhor? Então confira o papo que batemos com ele:

“Bad Suggestion”, que nasceu depois de superar a depressão, homenageia a noiva com foto na capa do single

O release de “Bad Suggestion” diz que a música se refere a um período em que você teve depressão e chegou a passar por sessões de hipnose. Como foi essa história? Em 2019, eu tinha fechado o contrato com a Warner e estava convivendo no meio dos meus ídolos. Pra mim, já era coisa de outro mundo, e eu achava que iria aparecer no mercado da noite pro dia. Porém, depois de muita cabeçada, eu descobri que não é assim que funciona o mercado.

Naquele momento, eu comecei a ter várias crises de ansiedade, até que fui receitado por um médico com um remédio chamado Clonazepam. Toda vez que eu tivesse alguma crise de ansiedade, era pra tomar três gotas que iria dar uma acalmada, mas conforme o tempo foi passando, essas crises de ansiedade passaram a ser ataques de pânico.

Um dia, minha noiva Byanca me achou caído no quarto de casa, me levaram para o hospital e fiquei alguns dias fora do ar. O que me relataram é que eu tomei o frasco todo — eu de fato não lembro de absolutamente nada, nem do dia, nem de uns cinco dias depois. Assim que voltei ao normal, já me vi tomando antidepressivos, remédios como Rivotril, e eu não queria estar vivendo aquilo; estava na melhor fase da minha vida, e nunca iria tentar um suicídio naquele momento.

Pesquisando sobre depressão, caí em um dos vídeos do youtuber Pyong Lee explicando que hipnose era muito utilizada como tratamento. Eu achava que aquilo não funcionava, porém queria tanto voltar a viver com vontade que busquei conhecer o método. Fiz a minha primeira sessão de hipnose e parece que a depressão foi tirada com a mão. A partir disso, comecei a fazer constantemente, voltei a ter minha produtividade e me vi livre de todos os remédios. Aí eu fiz a “Bad Suggestion”.

Além de New Order, Stephan Bodzin e Gui Boratto, quais as outras grandes influências que você teve ao longo de sua vida e que culminaram na sua identidade musical? Depeche Mode, Bomb The Bass, The Shapeshifters, Armand Van Helden e bandas como Bon Jovi, Charlie Brown Jr, The Cure e LCD Soundsystem foram fundamentais para a criação da minha identidade. Tenho acompanhado muitos artistas da atualidade como Elekfantz, Coppola, L_cio, Shadow Movement, Flow & Zeo, Binaryh, que basicamente são os nomes que tenho estudado bastante pra ir evoluindo cada vez mais.

“Try Again”, primeiro single de Heisen

Sua música parece justamente conversar com a proposta do Elekfantz: é um som teoricamente underground, mas com bastante apelo pop. Não é aquele techno pesadão de galpões e raves, mas algo mais leve, que pode vir a ter mais apelo comercial. Você concorda? Os Elekfantz são uma das minhas maiores referências. Já tive oportunidade de dividir line com eles, assistir ao show deles do palco, inclusive o álbum “Dark Tales & Love Songs” deve ser um dos que mais ouvi na vida, e me inspirou muito em várias faixas que venho produzindo.

Eu não tenho muito apego nessa questão de ter mais visibilidade do público underground ou comercial, eu quero fazer músicas para as pessoas, independentemente de como o mercado me rotule. Mas concordo completamente.

Ainda no começo da sua jornada, você já tem dois lançamentos de peso, mas e quanto às apresentações como DJ? A pandemia deve ter atrapalhado muito os seus planos… Meu projeto começou a ter uma relevância durante a pandemia. No início dela, quando as coisas começaram a fluir melhor, surgiram algumas oportunidades no D-EDGE, mas logo a data caiu, o que me deixou um pouco triste, mas sabemos que é por um bom motivo. Porém, o club em si e todo o time tem apostado bastante no meu projeto — inclusive o próprio Renato Ratier tem sido um mentor de como conduzir meu projeto durante esse período.

A pandemia me atrapalhou na parte de apresentações, mas por outro lado, foi uma oportunidade para que eu fosse notado pelo mercado.

Set lançado recentemente pelo projeto Mothersip Live, do D-EDGE

Quais são seus diferenciais como DJ? Como é sua pesquisa? Quais as tracks essenciais? Eu busco fugir do que está em alta no momento, procuro buscar artistas que estão iniciando no mercado, e misturar com as minhas influências. Por mais que meu set seja de techno, eu busco montar meu setlist para emocionar o público e levá-lo ao estado de êxtase natural. Minha pesquisa sempre foi cavando o Traxsource, mas hoje, com o novo aplicativo Clubhouse, eu tenho descoberto muitos artistas que não tiveram nem oportunidade de lançar suas faixas.

As três músicas que não podem faltar no meu set são “Pentadrum”, do Gui Boratto com Hannes Bieger (não lançada), o remix de Layton Giordani para “For a Feeling”, de CamelPhat e ARTBAT, e um bootleg que fiz para “Ocean Tree”, da banda Feathered Sun.

É verdade que você está preparando 12 lançamentos para 2021? O que pode contar pra gente sobre esse projeto? Vem álbum aí? Exatamente! Houve alguns atrasos burocráticos, mas a intenção é de ter 12 lançamentos em 2021. O álbum era pra sair neste ano pela Universal, porém mudamos a estratégia, pois as faixas são muito mais para clubs, então o lançamento vai ficar para dezembro ou janeiro — ainda estamos definindo.