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Coluna do Matheus – O poder da cena regional de música eletrônica e porque você deve apoiá-la

Com a popularização da música eletrônica no Brasil, estamos acostumados a frequentar grandes eventos, feitos por gigantes produtoras que investem milhares ou até milhões de reais em estrutura, organização, serviço, e artistas, com a finalidade de proporcionar uma festa de qualidade, e é claro, também lucrar bastante. Vale ressaltar que ninguém aqui está condenando o lucro, pois se o mercado da música eletrônica não gerasse capital, pra ser sincero, é bem provável que nem a Play BPM existiria.

Na verdade, o que quero te dizer é que não é em todos os lugares que isso acontece. Existem certas cidades em que a música eletrônica não é tão popular e que grandes eventos do gênero praticamente nunca aconteceram. Nesses lugares, a cena dance music é sustentada por poucos fãs, que a partir da criação de uma cena local, organizam pequenos encontros em bares, casas, e algumas mini festas de modo até amador, mas com um único propósito, o de vivenciar a música eletrônica.

Na minha ida até a Suíça, em julho de 2018, para visitar um amigo, pude presenciar algo que até então eu não tinha a mínima ideia de que poderia existir: uma cena de techno, numa cidade de 7 mil habitantes, que consegue alavancar quase mil pessoas nos bares locais para se divertir ao som do gênero em todos os finais de semana. É mais de 10% da população se concentrando no mesmo espaço para compartilhar da mesma música.

“Nem sempre foi assim. A região de Thun até recentemente não tinha nenhuma cena estabelecida e tínhamos que nos deslocar para cidades maiores, como Berna e Basel, para ir a algum evento de música eletrônica. Até que num belo dia, eu e alguns amigos decidimos fazer uma festa num pequeno bar da cidade por pura diversão. Como não possuíamos dinheiro nem para pagar DJs, tivemos que aprender a tocar e nós mesmos seríamos as atrações da noite. Também não havia dinheiro para a divulgação e assim a fizemos de boca em boca, convidando todo mundo. Numa festa em que esperávamos 30 pessoas, deu 300. Entretanto, o bar só tinha capacidade para 50, o que fez com que muita gente, num primeiro momento, não conseguisse entrar e até quebrassem a porta. Depois de muita confusão, a polícia apareceu e, mesmo sem porta, a festa seguiu normalmente. Com o dinheiro do primeiro evento, conseguimos pagar pelos estragos, pagar ao bar pelo local e ainda sobrou pra organização das próximas festas” diz Texx, DJ suíço-brasileiro que comanda o selo Soundbude.

“Também de início tivemos incontáveis problemas, desde donos de bares que não queriam pagar nossos artistas, até a polícia chegando em festas e mandando desligar tudo. Hoje, no entanto, com muito esforço, conseguimos alavancar uma cena bem firme na região e até começamos a produzir eventos em locais mais distantes. Nosso selo é conhecido nas capitais e já temos planos para eventos de dois dias e também em países vizinhos, como a Alemanha”, enfatiza o DJ.

É fato que na maioria dos países europeus a cena eletrônica se concentra nas grandes cidades. Se formos analisar a Suíça, principalmente, podemos inferir que até os festivais de música ficam restritos àquelas maiores. Diante disso, são iniciativas como as do DJ Texx que fazem com que os habitantes de cidades mais interioranas vivenciem um pouco da dance music.

Partindo para a realidade brasileira temos dois exemplos fantásticos em relação ao poder da cena local. O primeiro diz respeito a uma cena de techno consolidada em João Pessoa, na Paraíba, que é conhecida pela sua forte cultura regional, ligada ao forró e a música sertaneja. O crescimento dessa cena na cidade se deu, sem dúvidas, por conta do selo Underbeat, que desde 2014 iniciou a promoção de eventos relacionados ao gênero na cidade.

“No começo já chegamos a ter prejuízos enormes com eventos que promovíamos, porque que eles não tinham público suficiente para fechar a conta”, explica Pierre Alexander, sócio-fundador da marca. “Mesmo com as dificuldades a gente foi fazendo mais e mais eventos, educando o público para aquele som, que até então era novo para eles.” Atualmente os eventos da Underbeat ocorrem semanalmente em vários locais da cidade e na maioria das vezes, com casa cheia. A marca já chegou até a expandir para cidades vizinhas e hoje já é uma das grandes responsáveis pela cena underground no Nordeste. Você pode conferir a história do selo clicando aqui.

Nos estados do norte, a música eletrônica ainda não é tão valorizada como no resto do país. Entretanto, isso está mudando, principalmente, no Acre. Um projeto, que iniciou recentemente, tem mudado os rumos da cena da região. Tudo começou em janeiro de 2016, quando três amigos, em uma conversa na mesa de um bar, discutiam sobre onde passariam o carnaval, já que as opções da cidade sempre eram as mesmas e nenhuma delas contava com algo relacionado à música eletrônica. Conversa vai, conversa vem, decidiram que eles mesmos iriam criar um evento eletrônico para o carnaval da cidade.

O plano foi de criar uma festa pequena, onde eles pudessem reunir os amigos, pessoas próximas e reservar uma pequena quantia de ingressos para alguns interessados, mas que não superasse um total de 300 pessoas. Todavia, uma coisa com a qual eles não contavam foi a alta procura pela festa, muitos ingressos estavam sendo vendidos com antecedência e cada vez mais eram solicitados. Fato que fez com os próprios organizadores se empolgassem e tivessem que refazer todo o evento, já que o planejado era ser algo mais simples.

Diante disso, mudaram o local para um maior, aumentaram o número de atrações, reformularam toda a estrutura e segurança e, assim, deram o nome ao evento de Electric Summer Carnival – ESC, aonde em sua primeira edição contou com cerca de 1000 pessoas, com número de ingressos esgotados. Hoje, com várias edições de experiência, o projeto já conta com super telões, iluminação, LEDs, lasers, camarotes, show pirotécnico e um mega time de patrocinadores, com um só objetivo: fazer no Acre a maior cena de música eletrônica da região norte.

E você? Conhece algum exemplo de cena local que fez expandir os horizontes da música eletrônica para a região onde está inserida? Deixe sua mensagem!